sexta-feira, 11 de abril de 2014

Campos Eletromagnéticos de Extremamente Baixa Frequência (EBF)

    Olá caros leitores!

    Hoje irei dar-vos a conhecer uma temática bastante relevante, referente aos Campos Eletromagnéticos de Extremamente Baixa Frequência (EBF) e o seu impacto na saúde pública. Primeiramente, torna-se necessário definir o conceito de Campo Eletromagnético, apesar de constituir um conceito bastante abstrato, este pode ser descrito como um campo composto por dois vetores de campo: o campo elétrico e o campo magnético, sendo que estes dois campos existem sempre que ocorre fluxo de corrente elétrica. O campo elétrico é originado a partir de cargas elétricas, tendo como unidade de medida o V/m (Volt por metro); por outro lado o campo magnético é gerado pela movimentação de cargas elétricas (corrente elétrica), podendo ser expresso em T (Tesla), mT (Militesla), µT (Microtesla) ou ainda em G (Gauss), em que 10.000 G= 1T. Em ambos os campos, elétrico e magnético, a intensidade é maior na proximidade da fonte e diminui com a distância.

Figura 1 - Representação do Campo Eletromagnético
    O Campo Eletromagnético existe onde quer que a eletricidade seja gerada, transmitida ou distribuída em linhas ou cabos de energia. Sempre que há um fluxo de eletricidade, campos elétricos e magnéticos são criados nas proximidades dos condutores elétricos e nas proximidades de equipamentos elétricos, sendo possível afirmar que desde que o uso da eletricidade se tornou uma parte integrante do estilo de vida moderno, o campo eletromagnético está omnipresente no ambiente. 2 Desta forma, a população está continuamente exposta a campos eletromagnéticos de diferentes frequências, frequência esta medida em Hertz (Hz), que irá permitir a separação do espectro total dos Campos Eletromagnéticos em bandas discretas, tendo em conta o a intensidade da mesma, obtendo-se a seguinte classificação: campos eletromagnésticos estáticos, campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF), radiação de radiofrequência e micro-ondas, radiação infravermelha, luz visível, radiação ultravioleta, radiação ionizante.
Figura 2 - Espectro dos Campos Eletromagnéticos
     A radiação ionizante que apresenta um nível de frequência bastante elevado inclui os raio-x, raios-gama emitidos por materiais radioativos e raios cósmicos, sendo que esta radiação tem a capacidade de penetrar no ser humano, possuindo energia suficiente para ionizar e quebrar ligações químicas, provocando danos nos orgãos internos e tecidos e até mesmo no próprio DNA. Todos os outros tipos de radiação que não possuam energia suficiente para causar ionização, são denominadas de radiações não ionizantes, radiações estas com uma frequência mais baixa. Dentro deste tipo de radiações é possível destacar as três principais nomeadamente os campos eletromagnésticos estáticos, os campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF)e a radiação de radiofrequência e micro-ondas. 3

   Os Campos Eletromagnéticos à frequência industrial, isto é com uma frequência de 50 Hz são considerados como de “Extremamente Baixa Frequência” (EBF ou ELF na terminologia inglesa) quando comparados com as frequências caraterísticas da generalidade dos equipamentos de telecomunicações (na ordem dos MHz ou GHz), ou das frequências superiores da radiação de radiofrequência e micro-ondas, da radiação infravermelha, da luz visível, ou das radiações ultravioletas e radiações ionizantes, com frequências na ordem dos THz. Na verdade, os campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF) são gerados a partir de instalações elétricas, os quais induzem correntes elétricas no organismo, que, dependendo da intensidade, poderão originar efeitos no funcionamento do ser humano, sendo que este fenómeno ocorre devido ao fato de no campo magnético não se verificar o efeito de blindagem da pele, o que faz com que a sua penetração no corpo humano induza correntes elétricas no seu interior, variáveis de acordo com a resistividade e forma dos órgãos em causa,com as dimensões do corpo e outras caraterísticas individuais; ao contrário do que ocorre no campo elétrico, uma vez que este é fortemente atenuado dentro do corpo humano devido às propriedades da pele, que a tornam praticamente como uma blindagem contra a penetração do campo, em que a própria presença do corpo modifica as linhas de força do campo elétrico.
      Atualmente, verifica-se uma grande preocupação com a exposição humana a campos eletromagnéticos, particularmente os de extremamente baixa frequência (EBF), uma vez que o número de pessoas expostas a estes campos cresceu exponenencialmente nos últimos anos devido à grande expansão do setor da energia elétrica. Este fato despertou a atenção por parte  da comunidade científica que passou a investigar se a exposição a estes campos eletromagnéticos produziria efeitos adversos à saúde da população. Desta forma, desde o final dos anos setenta, foram conduzidos diversos estudos no sentido de avaliar uma possível associação entre esses campos e consequências negativas para a saúde da população exposta, abrangendo as etapas da geração, produção, transmissão e uso da energia elétrica. Em 1996, a Organização Mundial de Saúde (OMS) implantou o Projeto Internacional de Campos Eletromagnéticos para investigar os potenciais riscos para a saúde associados a tecnologias emissoras dos campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF), sendo que em 2002 a International Agency for Research on Cancer (IARC) publicou uma monografia classificando estes campos como "possivelmente carcinogénicos para os seres humanos". 4

    Esta classificação deveu-se sobretudo à associação entre a leucemia infantil e os campos magnéticos das correntes residenciais, identificada primeiramente por Wertheimer & Leeper (1979) e encontrada subsequentemente num certo número de estudos epidemiológicos, promovendo a avaliação experimental e epidemiológica da investigação e do risco neste tema. As considerações da IARC em 2002, mantidas pela OMS em 2007 face aos resultados de investigações posteriores, que serviram de base à classificação dos campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF) como possivelmente cancerígenos, resumem-se seguidamente, segundo a própria OMS: 4


   Para uma melhor noção do significado da classificação da IARC, na tabela seguinte exemplificam-se vários agentes classificados por aquela organização para os três níveis de perigosidade considerados.

Tabela 1 - Exemplos da classificação da IARC quanto à carcinogenicidade
    Os Campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF) encontram-se no mesmo nível de perigosidade atribuída que outros agentes como o café ou os vegetais de conserva e, na verdade, a classificação de possibilidade de carcinogenicidade significa apenas que não está provado que sejam inócuos. É de sublinhar, que a classificação da IARC, corroborada pela OMS, se aplica apenas à leucemia infantil e que, até ao momento ainda não se encontrou qualquer comprovação laboratorial, resultando apenas de estudos epidemiológicos de interpretação estatística polémica. Em Outubro de 2005, a OMS reuniu um Grupo de Trabalho de especialistas científicos para avaliar qualquer risco para a saúde que pudesse existir pela exposição a campos eletromagnéticos numa faixa de frequência maior do que 0 até 100.000 Hz (100 kHz), procedendo à revisão das evidências para vários efeitos adversos sobre a saúde nomeadamente outros tipos de cancro em crianças e adultos, depressão, suicídio, distúrbios cardiovasculares, disfunções na reprodução, distúrbios no crescimento, alterações imunológicas, efeitos neuro-comportamentais e doenças neuro-degenerativas. O Grupo de Trabalho da OMS concluiu que a evidência científica que sustenta uma associação entre a exposição a campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF) e todos estes efeitos sobre a saúde é muito mais fraca que para a leucemia infantil. 5

      Legislação Comunitária e Nacional:

     A 30 de Julho de 1999, o Jornal das Comunidades publicou uma " Recomendação do Conselho (Europeu) de 12 de Julho de 1999, relativa à limitação da exposição da população aos campos eletromagnéticos (0 Hz – 300 GHz) " 6, em que recomendava a adoção pelos Estados Membros de medidas que garantissem a limitação dos campos eletromagnéticos a que as populações são expostas. Os valores indicados são uma transcrição perfeita dos valores indicados pela International Commision on Non-Ionizing Radiation Protection (ICNIRP) no ano de 1998. Seguidamente é apresentado um pequeno quadro que resume a Recomendação Europeia 519/EC/1999.
Quadro 1 - Resumo da Recomendação Europeia 519/EC/1999
     Posteriormente, em Abril de 2004, o Parlamento Europeu formulou em termos de diretiva obrigatória as indicações da referida recomendação no que se referem aos ambientes ocupacionais (trabalhadores do setor eléctrico), a chamada Diretiva Europeia 2004/40/CE 7. Em seguida, é apresentado um pequeno resumo das principais diretrizes descritas nesta Diretiva. 

Quadro 2 - Resumo da Diretiva Europeia 2004/40/CE

    Em Portugal, a 23 de Novembro de 2004, foi publicada a Portaria nº 1421/2004 8 que adota para Portugal a Recomendação 519/EC/1999 do Conselho Europeu, que contém prescrições quanto às obrigações de empregadores e trabalhadores do setor eléctrico. Os valores de limitação básica e de referência publicados correspondem a uma transcrição dos valores recomendados pelo Conselho Europeu e, por conseguinte,dos valores indicados pela ICNIRP em 1998. No que se refere à frequência industrial de 50 Hz utilizada na transmissão e distribuição de energia elétrica em Portugal:


     Soluções Técnicas para a redução da exposição a Campos Eletromagnéticos gerados por Linhas Aéreas e Subterrâneas:

    O campo magnético produzido por uma linha de energia em Alta Tensão, medido à altura, relativamente ao solo, de um ser humano, depende da sua distância ao solo e da geometria da sua disposição trifásica, e é proporcional à corrente que a percorre. A distância ao solo da linha, por outro lado, varia ao longo do percurso entre postes (vão) e atinge um mínimo, definido regulamentarmente por razões de segurança, perto do ponto médio do vão. A partir destas considerações, é possível definir algumas orientações que permitem reduzir a intensidade dos campos a uma determinada distância do solo, tais como a elevação das linhas, usando postes mais altos, ou a redução da distância entre os condutores de fase. 9
    Desta forma, têm sido estudas várias alternativas técnicas no sentido de minimizar o impacto de possíveis efeitos dos campos eletromagnéticos sobre a saúde, estando simultaneamente em consonância com aspetos de segurança, confiabilidade, requisitos de isolamento e afastamentos eétricos, preocupações ambientais, custos, operação e manutenção. Dentro das várias soluções propostas, é possível destacar as seguintes:

- Enterramento das Linhas;
- Elevação da altura das Linhas;
- Modificação da geometria dos condutores;
- Blindagem Magnética de Linhas;
- Utilização de condutores cobertos com espaçadores (Spacer Cable).

      Enterramento de Linhas:
    
    O enterramento das linhas aéreas poderá eliminar o impacto visual, contudo, não elimina os campos magnéticos gerados por elas. Na verdade, sobre as valas de enterramentos dos cabos, os campos são mesmo, regra geral, muito mais intensos que os máximos resultantes das linhas aéreas (para iguais níveis de tensão e corrente), uma vez que a sua distância relativa aos seres humanos é muito menor do que para as linhas aéreas. Assim sendo, o enterramento das linhas aéreas só com medidas adicionais de blindagem magnética é que constitui efetivamente uma solução para o problema dos campos gerados pelas linhas. 9

Figura 3 - Campos magnéticos a 1 metro de altura do solo para uma linha aérea (a azul) e um cabo subterrâneo (vermelho) com as mesmas tensão e corrente nominais
     Elevação da altura das Linhas:

     Uma possível opção técnica seria a elevação das linhas com postes mais altos, uma vez que o campo magnético atinge a intensidade máxima no ponto médio dos vãos das linhas, onde a altura destas é menor. 9 No entanto, tem a desvantagem de agravar o custo dos postes e de ter maior impacto visual no meio envolvente.



Figura 4 - Campos magnéticos a 1 metro de altura do solo para uma linha aérea com diferentes alturas do condutor relativamente ao solo

      Modificação da geometria dos condutores:

    escolha adequada da geometria dos apoios dos condutores tem um significativo impacto sobre o valor do campo magnético a 1 metro do solo. A “compactação” (redução da distância entre condutores), para linhas simples é uma solução eficaz, mas limitada pela necessidade de manter as necessárias distâncias de isolamento entre condutores, para além da intensificação do campo elétrico resultante dessa maior proximidade. 10

Figura 5 - Campos magnéticos a 1 metro de altura do solo para uma linha aérea com diferentes geometrias dos condutores resultantes de apoios diferentes

      Blindagem Magnética de Linhas:

   Para linhas já existentes e troços relativamente curtos, uma solução técnica alternativa é a respetiva blindagem magnética através da instalação de condutores passivos de blindagem. A redução é tanto maior quanto mais próximos estiverem os condutores de blindagem dos ativos, mas a redução global conseguida não é uniforme, sendo por isso uma solução limitada em termos de redução do Campo Magnético. 10

Figura 6 - Blindagem magnética (a vermelho) de um vão de linha com dois condutores passivos de blindagem

      Utilização de condutores cobertos com espaçadores (Spacer Cable):

    Dado que o campo magnético é proporcional à distância entre condutores de fase, uma forma de o reduzir será “compactar” as linhas, ou seja, reduzir essa distância. Esta medida consiste numa tecnologia que tem vindo a ser desenvolvida nos últimos anos e que tem encontrado vasta aplicação nas redes de Distribuição da Escandinávia e no Brasil, baseando-se no uso de condutores revestidos ou cobertos, por um material plástico de reduzida espessura que lhe confere um isolamento parcial. Algumas das justificações correntes deste isolamento são a melhoria de comportamento em zonas densamente arborizadas e/ou com neve e gelo assim como a preservação da avifauna, bem como a redução da distância entre os condutores e consequentemente uma redução do efeito coroa (ionização das moléculas de ar em torno dos condutores, criando uma fina coroa de ar devido à presença do Campo Elétrico). 10

Figura 7 - Transformação de uma linha de Média Tensão (“Reference”) numa linha revestida com espaçadores

   Posto isto, apesar da inconclusibilidade dos estudos epidemiológicos já realizados por parte da comunidade científica no sentido de comprovar uma possível relação de causa-efeito entre a exposição a campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF) e a leucemia infantil, bem como outras patologias, deverá ser adotada por parte de todos os governantes, e principalmente das empresas do setor elétrico e telecomunicações uma política assente no principio da precaução, pois como refere a OMS: Justifica-se e é razoável a implementação de medidas de baixo custo para reduzir a exposição (aos campos magnéticos de EBF), desde que isso não comprometa os benefícios para a saúde, sociais e económicos da energia elétrica... Deverão considerar-se mudanças nas práticas de engenharia para se reduzir a exposição aos campos EBF de equipamentos e dispositivos, desde que isso produza outros benefícios adicionais,tais como maior segurança, ou um custo pequeno ou nulo.” 11

     Desta forma, os governantes deverão estar sensibilizados para os medos das populações, demonstrando simultaneamente empenho fiscalizador mas também promovendo ações de esclarecimento, possibilitando assim a aquisição de conhecimentos reais e estimulando o diálogo entre as duas partes, uma vez que os decisores políticos constituem uma peça fundamental na implementação da política de precaução, pois segundo a OMS: As autoridades nacionais devem permitir a tomada de decisões informadas por todas as partes interessadas, incluindo informação sobre como podem os indivíduos reduzir a sua própria exposição”. 11 Por outro lado, todas as empresas  do setor elétrico e telecomunicações também desempenham um papel fundamental na minimização da exposição aos campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF) por parte dos seus trabalhadores mas também do público em geral, assumindo uma postura proativa na gestão do risco e promovendo uma comunicação aberta da informação ao público, como acontece na EDP Distribuição, uma vez que esta já acionou algumas medidas entre as quais é possível destacar: caraterização das instalações da EDP Distribuição relativamente a campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF), de acordo com as novas normas internacionais de medição; Definição, orçamentação preliminar e ordenaçãopor relação custo-benefício de soluções técnicas para a redução de campos eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF) em instalações tipo da EDP Distribuição.


Fontes Bibliográficas:
1- WHO- World Health Organization: What are electromagnetic fields?, Junho 2006
9- Pinto de Sá, J. Campos Eletromagnéticos de extremamente baixa frequência (EBF), Saúde Pública e Linhas de Alta Tensão, Fevereiro 2008;
10- EDP Distribuição - Campos Eletromagnéticos de Extremamente Baixa Frequência (EBF), Outubro 2009;

Até breve!

Ana Machado

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