sexta-feira, 30 de maio de 2014

Riscos Elétricos


Caros leitores!


    Após ter sido anunciado recentemente através dos meios de comunicação social a notícia de que um trabalhador ao serviço do grupo EDP tinha sofrido um acidente de trabalho mortal numa subestação em Bragança, considerei importante abordar mais aprofundadamente a problemática dos riscos elétricos em contexto laboral, bem como as consequências a nível material mas principalmente sob o ponto de vista humano e as respetivas medidas e ações de segurança e proteção desses mesmos riscos. Como já tem sido referido, a eletricidade constitui atualmente um bem essencial, que possibilita a realização de diversas atividades de forma mais eficiente, colocando ao dispor dos seus utilizadores diversos equipamentos que  garantem e/ou auxiliam a concretização das mais variadas tarefas profissionais. Infelizmente, esta tecnologia não está isenta de riscos, riscos esses que se colocam ao nível do utilizador comum mas, sobretudo, ao nível dos profissionais que trabalham no setor elétrico, sendo por isso importante uma consciencialização relativamente aos riscos que a sua utilização indevida pode acarretar, bem como às medidas de segurança e proteção que permitam prevenir e ou/minimizar as consequências que possam advir desses mesmos riscos. 
      Para que se verifique a ocorrência do risco elétrico, é necessário que estejam presentes cada uma das seguintes condições nomeadamente: existência de um circuito elétrico formado por elementos condutores, que o mesmo circuito esteja fechado ou possa fechar-se e que o circuito apresente diferença de potencial ou se encontre em tensão. No que diz respeito ao acidente elétrico propriamente dito, este pode ocorrer devido a contactos diretos ou contactos indiretos, que irei explicar na figura seguinte.

Figura 1 - Tipos de contactos que poderão originar um acidente elétrico
    Em relação às consequências de um possível acidente elétrico, torna-se essencial, ter presente dois conceitos fundamentais: a eletrocussão, isto é, um choque elétrico que origina um acidente mortal e a eletrização, ou seja, um choque elétrico que não causa um acidente mortal, mas que pode originar outro tipo de acidentes, com consequências que podem ser mais ou menos graves.O que distingue a eletrocussão da eletrização são um conjunto de fatores entre os quais se pode destacar:
Figura 2 - Fatores que definem a diferença entre a eletrocussão e a eletrização
Figura 3 - Principais consequências de um acidente elétrico
       Ainda relativamente aos efeitos que advêm da ocorrência de um acidente elétrico no ser humano, estes estão diretamente relacionados com um conjunto de fatores físicos e biológicos, que irão determinar a gravidade das consequências do contacto da corrente elétrico com o corpo humano:
  • Intensidade da Corrente ElétricaTem um papel fundamental na origem de lesões provocadas pela corrente elétrica, sendo que para o ser humano o limiar da perceção da corrente alternada de frequência industrial (50/60 Hz) é da ordem de 1mA (1mA=0.001 Ampere) e para corrente contínua cerca de 5 mA; 3
Figura 4 - Intensidade da corrente elétrica e respetivos efeitos sobre o corpo
  • Resistência do corpo humano – Tal como qualquer material o corpo humano também oferece alguma resistência à passagem da corrente elétrica, ou seja, possui uma determinada resistência elétrica, em que habitualmente o valor dessa resistência situa-se entre os 1000 e 2000 Ω. Simultaneamente existe também a chamada resistência cutânea do corpo que varia mediante: a superfície de contacto (maior a superfície menor a resistência), estado do revestimento (uma mão calosa é mais isolante que o dorso da mão), pressão de contacto (a resistência cutânea é tanto menor quanto maior for a pressão exercida pelo ponto de contacto do corpo humano sobre o condutor elétrico), estado de hidratação (a pele húmida tem uma resistência muito menor que a pele seca), duração do contacto (quando existe um contacto mais prolongado a pele apresenta uma resistência mais baixa) e a tensão de contacto; 3
  • Percurso da Corrente Elétrica através do corpo humano – Quando a corrente elétrica flui através do corpo humano, regra geral toma o trajeto mais curto entre os dois pontos de contacto. Por norma, a corrente elétrica circula das mãos para os pés ou de uma mão para outra, situação esta que confere grande perigo, pois caso a corrente elétrica atravesse alguns dos órgãos vitais (por exemplo o coração), a consequência poderá ser fatal; 3
  • Tensão Elétrica – Quanto maior for a tensão ou a diferença de potencial aplicada num condutor, maior será a intensidade da corrente elétrica que circula nesse mesmo condutor, assim, instalações com tensões elevadas são mais perigosas pois são suscetíveis de fazer passar pelo corpo humano correntes elétricas de maior intensidade. Desta forma, uma tensão mais baixa (como na Baixa Tensão) aplicada a um indivíduo que não esteja devidamente isolado, poderá ser mais perigosa do que uma tensão mais elevada (como na Alta Tensão) aplicada a um indivíduo devidamente isolado; 3
  • Tempo de Exposição à Corrente Elétrica – Os efeitos da corrente elétrica sobre o ser humano estão fortemente dependentes da corrente elétrica efetiva que atravessa o corpo e do tempo de exposição à mesma; 3
Figura 5 - Gráfico Tempo/Intensidade da corrente elétrica que resume os principais efeitos produzidos por correntes elétricas alternadas com uma frequência compreendida entre os 15 e 100 Hz. A zona a) da figura separa as zonas 1 e 2 onde normalmente não se verificam efeitos fisiológicos perigosos para o ser humano das zonas 3, 4 e 5 onde estes podem ser bastantes graves. A título de exemplo uma corrente elétrica de 100 mA torna-se perigosa para tempos de exposição superiores a 0,10 s
  • Frequência da Corrente Elétrica – Constitui um fator determinante nas consequências que possam advir do contacto com a corrente elétrica. A perigosidade da corrente elétrica diminui com o aumento da frequência, sendo que as frequências industriais (50/60 Hz) são as mais perigosas, acima dos 10.000 Hz, as principais consequências associadas são as queimaduras, caso a corrente elétrica seja bastante intensa. 3

        Na Baixa Tensão (BT), a morte é sobretudo condicionada pela ação local da quantidade de corrente elétrica que atinge o coração do indivíduo. Já na Alta Tensão (AT), por sua vez, a morte  surge principalmente devido à extensão das queimaduras sofridas. No que diz respeito às possíveis causas de um acidente elétrico, estas encontram-se agrupadas em categorias bem definidas nomeadamente as causas diretas (como por exemplo um defeito de isolamento da instalação eléctrica, contacto acidental com uma peça do cabo condutor sob tensão, entre outras) e as causas indiretas (como por exemplo ligação súbita à rede de alimentação, entre outras). Passando para situações mais específicas, as causas mais comuns dos acidentes de trabalho que envolvem eletricidade são:

- Utilização incorreta de equipamentos devido à falta de formação ou cuidado;
Utilização de equipamentos em tarefas para as quais não estão adequadas;
Utilização de equipamentos danificados/ em mau estado de conservação;
Incorreta utilização dos equipamentos de proteção individual;
- Utilização de equipamentos com cabos de ligação deteriorados;
Movimentação de aparelhos e/ou equipamentos em tensão sem a devida aplicação das respetivas medidas de segurança e proteção. 4

        Como já foi documentado em publicações anteriores, existem vários tipos de  medidas a tomar de forma a garantir uma eficaz política de proteção e segurança contra os riscos elétricos. Primeiramente existem as medidas informativas, essenciais  a qualquer situação, e que têm como objetivo avisar e dar a  conhecer a existência dos riscos elétricos , alguns casos  deste tipo de medidas são: sinalização de segurança, normas  e procedimentos de segurança, entre outras. Se se quiser atuar contra a possibilidade de contactos  diretos, as medidas de proteção ativa são as mais  adequadas, nomeadamente:
  • Recobrimento das partes ativas da instalação elétrica;
  • Uso de tensão reduzida de segurança;
  • Afastamento das partes ativas;
  • Interposição de obstáculos. 4
     Por outro lado, se o objetivo for proteger os indivíduos de contactos indiretos, existem alguns tipos de medidas de  proteção passiva que podem ser empregados:
  • Utilização de tensão reduzida de segurança;
  • Separação dos circuitos. 4
     Para além das medidas referidas anteriormente deve-se também ter em atenção outros exemplos de medidas de proteção e segurança contra os riscos elétricos, entre as quais é possível destacar:
  • Isolamento dos elementos condutores estranhos à instalação elétrica;
  • Inacessibilidade simultânea de massas e elementos condutores estranhos à instalação elétrica;
  • Estabelecimento de ligações equipotenciais;
  • Aplicação das chamadas “5 Regras de Ouro”.
Figura 6 - Ilustração das "5 Regras de Ouro"

      Para finalizar, gostaria de refletir um pouco sobre um aspeto bastante relevante e que muitas vezes é subestimado, que consiste na importância do papel da comunicação do risco na promoção da segurança e saúde no trabalho. Na verdade, durante o presente estágio, tive a oportunidade de realizar diversas auditorias, podendo desta forma contactar com uma vasta panóplia de equipas de trabalhadores, permitindo-me colocar em prática esta valiosa ferramenta, o que me possibilitou amadurecer e evoluir enquanto futura técnica de segurança e saúde no trabalho. Segundo Palencar, 2008 5A Comunicação do Risco é um processo de interação e intercâmbio de informações entre os indivíduos, grupos ou instituições sobre ameaças à saúde, à segurança ou ao ambiente, com o propósito de que a comunidade conheça os riscos aos quais está exposta e participe na sua solução, sendo um processo intencional e permanente..., assim, é possível constatar que a mesma constítui um modelo de comunicação fundamental na promoção da consciencialização dos indivíduos relativamente às suas tomadas de decisão e posições no que diz respeito aos riscos a que se encontram expostos. No entanto, para que  a comunicação seja eficiente e bem sucedida, é necessário que o recetor defina primeiramente qual a mensagem que quer transmitir, os objetivos que pretende alcançar com a mesma, qual o público-alvo e por fim adaptar a sua postura e linguagem. De uma forma geral, pode-se afirmar que a linguagem utilizada neste tipo de comunicação deverá ser simples, acessível, célere, coerente, envolvida num ambiente “aberto” e transparente, favorecendo a construção da confiança e credibilidade do público – alvo, fatores estes fundamentais para o comprometimento e perceção dos trabalhadores relativamente à gestão e prevenção dos riscos laborais. 

          Fazendo um balanço de todo o trabalho que realizei, posso afirmar que nas primeiras auditorias que efetuei no início senti-me algo insegura e receosa uma vez que teria de demonstrar os meus conhecimentos mas principalmente conseguir passar a mensagem que queria e demonstrar a importância que a informação por mim transmitida teria na promoção da saúde e segurança dos trabalhadores. Este fato, levou a que tivesse adotar estratégias e mecanismos que contribuíssem para melhorar as minhas capacidades comunicativas, fazendo-me assim evoluir enquanto futura profissional, de forma transmitir a informação desejada aos trabalhadores relativamente aos riscos e respetivas medidas e ações corretivas, tendo recebido algum feedback, o que me permitiu perceber se a mensagem tinha sido efetivamente compreendida e de que forma. Outro aspeto que considerei extremamente positivo foi o fato de alguns trabalhadores, durante as auditorias, terem o à vontade suficiente para falar abertamente sobre algumas situações negativas que tinham vivenciado por não terem respeitado e cumprido devidamente os métodos e regras de segurança no que diz respeito à exposição aos riscos existentes, admitindo, no entanto, a sua responsabilidade e referindo que atualmente estavam muito mais despertos e conscientes para a existência dos perigos e riscos laborais e respetivas consequências que daí possam possam advir, adotando uma postura a atitude mais pro-ativa e responsável sobre a promoção e prevenção da segurança em contexto laboral.
   Para concluir, considero que a comunicação do risco é uma ferramenta útil no sistema de gestão da segurança e saúde no trabalho que não deve ser descurada, pois permite incrementar a participação de todos os colaboradores que constituem uma determinada organização, de forma a motivá-los para a adoção de procedimentos seguros bem como para a constante monitorização do sistema contribuindo para uma consequente atualização e adaptação face às exigências quer internas resultantes de uma política de segurança pré-definida, quer externas fruto das exigências legais e normativas às quais uma organização deve dar cumprimento, otimizando os seus resultados, em prol da segurança de todos preservando a sua saúde e o seu bem-estar físico e psíquico.


        Fontes Bibliográficas:
    2- EDP – Manual de Segurança – Prevenção do Risco Elétrico, Outubro 2002;
    4- Nunes, F. Manual Técnico: Segurança e Higiene do Trabalho, Setembro 2007;
    5- Palencar, M. Risk Communication and community right to know: Public Relations to inform, Janeiro 2008.


       Até à próxima publicação!


      Ana Machado

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