Na publicação de hoje irei-me debruçar sobre uma
nova temática, temática esta referente aos compostos Policlorobifenilos, mais
vulgarmente conhecidos por PCB´s. Estes compostos representam um conjunto de
substâncias químicas sintéticos,
sem cor, formadas por átomos de cloro, carbono e hidrogénio, possuindo um vasto leque de propriedades
físico-químicas, das quais se destacam as seguintes:
Figura 1 - Algumas propriedades físico-químicas dos PCB´s |
Figura 2 - Estrutura Molecular dos PCB´s |
A produção de PCB´s iniciou-se em 1929 alcançando o seu pico nos anos 70, sendo que estes compostos continuaram a ser largamente utilizados até meados dos anos 80 em diversas aplicações. Devido às
suas propriedades dielétricas, a principal aplicação foi em equipamento elétrico,
nomeadamente em óleos isolantes de transformadores e condensadores, no entanto,
foram igualmente utilizados no fabrico de uma vasta gama de outros produtos
como sejam por exemplo, lubrificantes, óleos de corte, plásticos, lâmpadas
fluorescentes, entre outros. A
indústria foi o setor onde se verificou a maior aplicação destes compostos, no
entanto, a sua presença estendeu-se, naturalmente, a todo o tipo de
infra-estruturas requerendo transformação de corrente elétrica, como sejam
edifícios de serviços, comércio e de habitação. 2
As várias aplicações destes
compostos dividiam-se usualmente em duas tipologias distintas:
- Usos fechados, no caso da aplicação
em fluidos dielétricos (transformadores, condensadores herméticos),
hidráulicos, de transferência e calor, óleos lubrificantes, aditivos a tintas,
solventes, entre outros. As emissões resultantes destas utilizações provinham de
situações de fugas, incêndios, descargas ilegais, eliminações irregulares e nas
operações de eliminação dos equipamentos no fim da sua vida útil;
- Usos abertos, quando os PCB´s eram aplicados, em quantidades geralmente reduzidas,
como aditivos a pesticidas, retardadores de chama, tintas. Nestes
casos, as principais fontes emissoras estavam associadas à deposição destas
substâncias em aterro.
Figura 3 - Exemplo de equipamento elétrico contendo PCB´s |
De acordo com estimativas,
a produção mundial acumulada destes compostos rondará 1.200.000 toneladas. Deste
total, cerca de 60% foi utilizado em transformadores, 15% em fluídos de
transferência de calor
e 25% como aditivos no fabrico de plastificantes, tintas, adesivos e
pesticidas. 3 Grande
parte destas quantidades encontra-se ainda em uso, essencialmente em equipamentos
elétricos, situação possível porque a legislação de alguns países (nos quais
Portugal se inclui) permite a utilização destes equipamentos até ao fim da sua
vida útil. Contudo, a
descoberta da elevada toxicidade e efeitos bioacumulativos associados a estes
compostos, levou a que a sua produção e comercialização fosse proibida a partir
dos anos 70 – em 1979 nos EUA e em 1986 na União Europeia, tendo já em 1976
sido limitada a sua aplicação a determinadas utilizações industriais. A
Convenção de Estocolmo, realizada em 2001, atribuiu a classificação de
“Poluentes Orgânicos Persistentes (POP)” a 12 poluentes, entre os quais se enquadravam
os PCB´s.
Na verdade, estes
compostos, enquanto Poluentes Orgânicos Persistentes (POP), caraterizam-se pela
sua resistência à degradação pelas vias química, fotolítica e biológica, caraterísticas
que favorecem a
persistência destas substâncias no ambiente durante muito tempo e o seu
transporte para longas distâncias (bioacumulação). 3 Os PCB´S
apresentam ainda a capacidade para se bioamplificar (acumulação progressiva ao
longo da cadeia alimentar) em condições ambientais específicas, podendo atingir
concentrações toxicológicas importantes. Atualmente, a libertação de PCB´s para
o ambiente pode ainda ocorrer, nomeadamente através de situações de descargas
indevidas de fluídos contendo PCB´s, fugas de equipamentos elétricos
contaminados, armazenamento irregular de resíduos contaminados, entre outras.
Para além dos efeitos nocivos
dos PCB´s sobre o ambiente, a exposição a cada um dos compostos está associada
a diversos malefícios para a saúde pública. Experiências com animais revelaram
que os PCB´s podem causar cancro e afetar os sistemas imunitário, reprodutivo,
nervoso e endócrino. 4 Contudo,
no que se refere aos efeitos sobre o ser humano, as únicas descobertas clínicas
consistentes apontam como efeito mais comum da exposição a teores elevados de
PCB´s o cloroacne, condição que provoca lesões na pele, desfigurando-a. Não obstante
o referido, alguns estudos sobre humanos revelaram dados que poderão indiciar a
existência de outros efeitos não-cancerígenos bem como de efeitos
potencialmente cancerígenos, incluindo ao nível do fígado. 4 A
absorção de PCB´s pelos seres vivos pode processar-se através da pele, por
inalação e pela cadeia alimentar, sendo esta última a causa de contaminação
mais comum. 5 Dentro do
organismo, estes compostos são transportados através da corrente sanguínea para
os vários músculos e para o fígado. Por serem altamente lipofílicos, os PCB´s
têm tendência a depositar-se nos tecidos adiposos viscerais, onde vão estimular
as enzimas do fígado, alterando a sua função.
Consoante a dosagem de exposição, são esperados os seguintes efeitos:
A dose letal de PCB´s
situa-se entre 0,5 g/kg e 11,3 g/kg de peso do corpo
Enquadramento Legal Nacional e Comunitário:
O Decreto-Lei n.º 378/76, de 20 de Maio,
foi o primeiro diploma a proceder à regulamentação do uso dos PCB´s para fins
industriais e comerciais.Na
elaboração deste diploma houve já uma preocupação de aproximação à
regulamentação comunitária no que diz respeito à comercialização de substâncias
e preparações perigosas, com o objetivo de salvaguardar a saúde humana e o
ambiente. O artigo
1.º proibiu a utilização de PCB´s para fins industriais ou comerciais, exceto
em algumas categorias tais como fluídos para transformadores ou condensadores
de grande potência, entre outros. Pouco tempo depois, foi publicada a Diretiva76/769/CEE do Conselho, de 27 de Julho respeitante à limitação da colocação no
mercado e de utilização de algumas substâncias perigosas. 5 No anexo
desta Diretiva, são referidas as exceções da proibição do uso de PCB´s,
nomeadamente para as categorias de aparelhos elétricos em sistema fechado, como
os transformadores. Esta Diretiva, que foi alterada seis vezes, sendo a última alteração
promulgada pela Diretiva 85/467/CEE de 1 de Outubro, que refere no seu artigo
2.º a obrigatoriedade de dar cumprimento à mesma até 30 de Junho de 1986.
Decorridos doze anos
sobre a data da publicação do Decreto-Lei n.º 378/76, e, sobretudo, após a
adesão de Portugal à CEE, foi publicado o Decreto-Lei n.º 221/88 de 28 de Junho, que consagrou uma estratégia relativa à eliminação dos PCB´s,
inserindo-se no processo de harmonização da legislação comunitária. 6 O
referido diploma visou limitar a comercialização e utilização, bem como
estabelecer condições de eliminação, das seguintes substâncias e preparações
perigosas:
a) Bifenilospoliclorados (PCB´s), à excepção dos
bifenilosmonoclorados e dos bifenilosdiclorados;
b) Terfenilospoliclorados (PCT´s);
c) Preparações, incluindo óleos usados, cujo teor em PCB´s ou PCT´s seja superior a 0,005% em peso.
Através deste Decreto-Lei
surgiu a obrigatoriedade de enviar à autoridade competente, um inventário
contendo informação solicitada no anexo do diploma, para todos os equipamentos
ou outros materiais que contenham PCB´s. O
presente documento referiu ainda que relativamente ao transporte e
eliminação, o detentor de resíduos é obrigado a proceder à respetiva eliminação
nas instalações adequadas, devendo entretanto proceder ao seu armazenamento de
acordo com as instruções elaboradas pela Entidade Competente. Em 16 de
Setembro de 1996, foi aprovada a Diretiva 96/59/CE, que teve por objeto aproximar as legislações dos Estados-Membros
em matéria de eliminação controlada dos PCB´s, de descontaminação ou eliminação
de equipamentos que contenham PCB´s e/ou de eliminação de PCB´s usados, tendo
em vista a destruição total destes, com base nas disposições da presente diretiva.
Atualmente, a gestão
dos PCB´s e dos equipamentos que os contêm, está regulada pelo Decreto-Lei n.º
277/99 de 23 de Julho 7 ,
alterado pelo Decreto-Lei n.º 72/2007 de 27 de Março 8, dando
resposta à necessidade de rever e adequar a legislação existente e estabelecer
a planificação para os processos de eliminação e descontaminação de PCB´s e
equipamentos que os contenham. Este diploma teve uma retificação através da
Declaração de Retificação n.º 43/2007 de 25 de Maio, alterando o ponto 1 do
artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 277/99, que estabelecia as regras a que ficavam
sujeitas a eliminação dos PCB´s, a descontaminação ou a eliminação de
equipamentos que contenham PCB´s e a eliminação de PCB´s usados, tendo em vista
a destruição total destes.
A legislação nacional proíbe:
A legislação nacional proíbe:
. A comercialização e a preparação de PCB´s;
. Qualquer tipo de incineração de PCB´s e/ou de PCB´s usados
em navios;
. A separação de PCB´s de outras substâncias com
vista à reutilização de PCB´s;
. O enchimento de transformadores com PCB´s.
No que diz respeito aos transformadores cujos
fluídos possuam níveis de contaminação mais baixos, ou seja, entre 50 a 500
ppm, é admitida a sua eliminação no fim da sua vida útil (artigo 6.º do
Decreto-Lei n.º277/99). A legislação obriga ainda à inventariação dos
equipamentos que contêm PCB´s e resíduos de PCB´s, através de informação
fornecida pelos respetivos detentores, todo o detentor de equipamentos que contenham mais
de 5 dm3 de PCB´s (no caso dos condensadores elétricos o limiar de 5
dm3 incluirá todos os elementos do seu conjunto) deve comunicar à Autoridade
Nacional de Resíduos (ANR) a quantidade que detêm.
Identificação de Equipamentos Potencialmente Contaminados:
Na identificação de equipamentos potencialmente
contaminados, deverão ser seguidas as ações seguidamente apresentadas 9:
Atualmente, os PCB´s podem ser detetados e quantificados por dois métodos diferentes, em óleos isolantes:
- Método
Colorimétrico
- Método
Cromatográfico
O método colorimétrico utiliza
sódio metálico para remover o cloro dos PCB´s presentes na amostra e o indicador
é utilizado para detetar a presença de cloro na amostra. É um método rápido e
expedito, aprovado pela EPA (Environmental Protection Agency) – EPA
SW-846 Method 9079 10. O método colorimétrico determina a
presença de todos os átomos de cloro existentes na amostra, não diferenciando
os compostos de PCB´s de outros compostos clorados, como por exemplo o
triclorobenzeno, que também pode estar presente nos óleos dos transformadores.
Esta incapacidade de distinguir a origem dos átomos de cloro pode resultar em
falsos positivos, ou seja, o óleo indica a presença de mais de 50 ppm de cloro,
no entanto isso não significa que a concentração de PCB´s seja superior a 50
ppm. O método colorimétrico é muito
útil quando se pretende efetuar um despiste rápido e económico ao teor de PCB´s
num fluído.
Por outro lado, o método
cromatográfico (CEI 61619 ou EPA Method 600/4- 81-045) 11 utiliza
uma técnica complexa e é um método mais dispendioso, no entanto, é necessário
recorrer a esta técnica em amostras de óleo com mais de 50 ppm de cloro, no
sentido de identificar e quantificar a concentração
de PCB´s na amostra. De uma forma resumida, apresentam-se no quadro seguinte,
as principais caraterísticas dos dois principais métodos de deteção de PCB´s.
Quadro 1 - Principais caraterísticas dos métodos de deteção de PCB´s |
Na sequência
da publicação do Decreto-Lei n.º 221/88 o qual introduziu a obrigatoriedade do
preenchimento do inventário de PCB´s pelos detentores de equipamentos
contaminados, a Autoridade Nacional de Resíduos (ANR) tem vindo a reunir a
informação reportada anualmente deste 1988. Desta forma, o Inventário Nacional
de PCB´s resulta da compilação da informação recolhida de várias empresas
nacionais ao longo dos anos. De seguida, apresento alguns quadros referentes à
inventariação de PCB´s realizada no ano de 2009.
Quadro 2 - Número de equipamentos com teor de PCB´s superior a 500 ppm e com PCB puro, por descontaminar em Novembro de 2009 |
Quadro 3 - Quantidades
de óleos contaminados (kg) por eliminar em Novembro de 2009 |
Da análise
dos presentes quadros, importa realçar que existem por descontaminar 15
transformadores com teor de PCB´s superior a 500 ppm e 29 transformadores com
PCB´s puro. Para estes equipamentos, o requisito mínimo de descontaminação a
realizar corresponderá a uma redução do seu teor de PCB´s para valores
inferiores a 500 ppm, de acordo com o Decreto-Lei nº 277/99. No que diz
respeito à sua origem, estes compostos estão presentes quase na sua totalidade
em equipamentos elétricos, sendo que 29 desses equipamentos (Quadro 2)
apresentam uma elevada contaminação de PCB´s (PCB puro), exigindo por parte das
Entidades Gestoras de Resíduos uma monitorização contínua e adequada, tendo
como prioridade de atuação a eliminação/descontaminação desses equipamentos.
Sendo a EDP Distribuição, uma empresa cuja atividade primordial passa pela realização de
manobras, procedimentos, operações em equipamentos/instalações elétricas, constituindo estes uma das principais fontes dos PCB´s; e uma empresa que
aposta fortemente na implementação de uma política de segurança transversal a
todos os seus trabalhadores, esta procedeu à adoção de determinadas medidas no
sentido de evitar e/ou minimizar não só a exposição dos trabalhadores mas
também de terceiros e estes compostos prejudiciais para a saúde pública,
nomeadamente: realização de um inventário de todos os equipamentos
contendo PCB´s na instalação incluindo indicação da sua localização; colocação de meios de prevenção contra derrames nos locais onde possam existir PCB´s; identificação do equipamento ou material contendo PCB´s, através das operações de recolha de amostras
de óleo em transformadores instalados na rede de distribuição para a sua despistagem; manter os trabalhadores fora de toda a possível fonte de
contaminação, devendo os mesmos permanecer nos locais somente o tempo
necessário para prestar o serviço de inspeção aos materiais armazenados;
organização de formações adequadas em matéria de Saúde e Segurança no Trabalho e
procedimentos relacionados com produtos químicos ,riscos físicos e biológicos; entre outras medidas.
Fontes Bibliográficas:
1- UNEP
Chemicals: PCB transformers and capacitors: From
management to reclassification and final disposal, Setembro 2002;
2- Agency for
Toxic Substances and Disease Registry (ATSDR): Toxicological profile for polychlorinated biphenyls (PCBs).
Atlanta, GA: U.S. Department of Health and Human Services, Janeiro 2000;
3- International
Agency for Research on Cancer (IARC): IARC
Monographs on the Evaluation of Carcinogenic Risks to Humans, Supplement 7,
Overall Evaluations of Carcinogenicity. An Updating of IARC Monographs Volumes1-42, Junho 1987;
4- Brown, J. Determination of PCB metabolic, excretion,
and accumulation rates for use as indicators of biological response and
relative risk. Environ. Sci. Technol. 28(13):2295–2305, Setembro 1994;
6- Decreto-Lei n.º 221/88, de 28 de Junho, relativa à comercialização utilização, bem como
estabelecer condições de eliminação das seguintes substâncias e preparações
perigosas: bifenilospoliclorados(PCB´s), terfenilospoliclorados (PCT´s); preparações, incluindo óleos usados,cujo teor em PCB´s ou PCT´s seja superior a 0,005% em peso;
7- Decreto-Lei n.º 277/99, de 23 de Julho, que estabele
as regras a que ficam sujeitas a eliminação dos PCB´s, a descontaminação ou
eliminação de equipamentos que contenham PCB´s e a eliminação de PCB´s usados,
tendo em vista a destruição total destes;
8- Decreto-Lei
n.º 72/2007, de 27 de Março, que transpõe para o direito interno a Diretiva n.º
96/59/CE, do Conselho, de 16 de Setembro, e estabelece as regras a que ficam
sujeitas a eleiminação dos PCB´s, a descontaminação oueliminação de equipamentos que contenham PCB´s e a eliminação de PCB´s usados,tendo em vista a destruição total destes;
9- Agência Portuguesa do Ambiente (APA):
Guia de Boas Práticas – Gestão de Equipamentos com PCB, Março de 2010;
Até à próxima publicação!
Ana Machado
Sem comentários:
Enviar um comentário